sábado, 17 de julio de 2021

O dia em que eu fiz a Valesca Popozuda se arrepiar




Era meu segundo carnaval trabalhando como repórter de cultura e dessa vez eu tinha me safado de cobrir os desfiles das escolas de samba de Florianópolis. Fui designada para algo muito melhor: entrevistar a Valesca Popozuda antes do seu show no evento de carnaval da prefeitura, bem no centro da cidade.
Diferente de quase todas as vezes em que me deram pautas com gente famosa, não fiquei nervosa, nem ansiosa, nem tive insônia ou taquicardia nos dias que antecederam a entrevista. Acho que eu sentia que éramos mais próximas, eu e a Valesca. Ao menos mais do que o Bumblefoot ou o Erasmo Carlos. Não conhecia muito da sua música e nem a admirava como artista, mas era uma mulher e naquela época estava chamando atenção por seus comentários feministas. 
Só o fato de eu não ter que ficar a madrugada inteira em pé na passarela Nego Quirido assistindo aos desfiles já me fazia sentir que aquela pauta de carnaval era praticamente uma folga. 
Quando eu e o fotógrafo chegamos ao backstage no horário estipulado pela assessoria de imprensa do evento, já havia outros jornalistas esperando e logo se uniram outros. Fiquei sem entender muito bem como seria o esquema, porque ninguém tinha comentado que seria uma coletiva e nem sequer havia espaço para isso ali atrás do palco. 
Os minutos passavam e a gente continuava ali, repórteres, fotógrafos e cinegrafistas, esperando o momento de entrar no camarim e entrevistar a Valesca antes de ela subir ao palco. Até que finalmente alguém do staff apareceu, informando que cada veículo teria 10 minutos no camarim e que primeiro entrararíam as equipes de televisão, que, segundo recordo, eram duas. Os dois repórteres das TVs estouraram o tempo e é claro que sobrou para nós, os de jornal. A mesma pessoa que nos havia passado as primeiras instruções voltou para dizer que na verdade teríamos míseros cinco minutos para entrevistar a Valesca e fazer as fotos.
Eu tinha algumas perguntas anotadas no meu bloquinho e destaquei as principais, já que não teria tempo de fazer todas. Quando anunciaram que eu seria a próxima a entrar no camarim, toda aquela tranquilidade e paz de espírito deram lugar a uma ansiedade repentina. Respirei fundo. Era só a Valesca Popozuda, não a Madonna. 
Fui entrando já com o gravador do celular ligado para não perder tempo. Ela estava em pé em frente a um banner das marcas que patrocinaram o evento, vestia uma espécie de maiô de glitter vermelho, decotado e com mangas longas. Entrei e a cumprimentei enquanto meu colega fotógrafo já ia fazendo as fotos para aproveitar o tempo.
Comecei com uma pergunta relacionada a ela ter trocado o desfile do Rio para fazer shows e em seguida fui logo para o tema do momento. “Como você se sente sendo considerada por muitas meninas uma das novas vozes do feminismo?”. Ela, que sorria o tempo todo, fez então uma pausa para respirar profundamente. Em seguida levantou o braço esquerdo na altura do peito, apontou para ele com o indicador da mão direita e disse: “Ai, fiquei até arrepiada com a pergunta, ó”. 

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