The life of an employed girl


Se eu olho para a esquerda da minha mesa no escritório, vejo a Sagrada Família. Mais ou menos do mesmo lado, só que um pouco mais para frente, vejo a Torre Glòries. Há dois meses oscilo entre achar que sou privilegiada e querer arrancar meus olhos por ter perdido a liberdade freelance, ter que sair do meu quarto todas as manhãs e falar com gente durante nove horas por dia, cinco dias por semana. Morrissey explica em Heaven Knows I’m Miserable Now.

Tenho um monitor extra, que ligo todos os dias porque todo mundo no escritório tem um monitor ligado ao lado do laptop. Ligo ele todas as manhãs e arrasto alguma página que finjo precisar consultar informações constantemente e deixo ela ali o dia inteiro. Tenho um pote de vidro onde todos os dias trago alguma coisa que coloquei no forno na noite anterior enquanto tomava banho. De vidro, porque sou uma adulta com um pote e medo de câncer. Tenho um cartão que me permite entrar e sair do escritório e que registra meu horário de entrada e de saída. Tenho reuniões presenciais em salas com nomes cool e às terças e quintas enchem duas cestas enormes com frutas variadas na cozinha.

A última vez que tive alguma dessas coisas foi há quase seis anos. Sentia falta delas? Não exatamente. Sinto falta de trabalhar todos os dias de pantufas, vestindo aquele suéter cinza quase transparente que já deveria ter sido aposentado há anos? Também não. O que não dá são os extremos.

Todo mundo achava que eu trabalhava menos horas que um ser humano normal sendo freelance. E todo munto tinha razão. Agora levo o dobro do tempo para fazer a mesma coisa que fazia antes em casa. De propósito. Coloquei minha velocidade em 0.50 porque, se vou ter que ficar sentada na minha mesa por oito horas de qualquer forma, é melhor estar ocupada que olhando para o teto. Ou para a Sagrada Família através da janela.

Não deixa de me impressionar a lógica capitalista que faz com que as empresas gastem todos os dias três horas a mais de água e eletricidade do que poderiam estar gastando, e decidi entrar no jogo. Não faço o segundo xixi da manhã em casa, guardo para o banheiro do trabalho. O mesmo antes de ir embora: saio com a bexiga completamente vazia. Passo fio dental em todos os dentes depois de comer, algo que, se fizesse em casa agora, seria uma tremenda perda de tempo. Às vezes também uso parte da minha pausa do almoço para ir ao supermercado ou ao bazar chinês comprar algo que preciso. Não porque depois do trabalho eu tenha algo muito mais importante do que ir à academia, limpar a privada ou estender a roupa. É sobretudo para que, pelo menos uma vez por semana, eu possa chegar, me jogar na cama por alguns minutos pensando: “não tenho NADA para fazer”, e sorrir.

Deixando as vicissitudes de lado, era isso que eu queria: terminar o ano com certa estabilidade econômica e, consequentemente, emocional. Ainda que isso tenha me obrigado a escolher apenas um entre os três assuntos que eu tinha pendentes para o meu último post do ano: meus favoritos do ano, minha retrospectiva do ano e isto que você acabou de ler.

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