domingo, 10 de março de 2024

Sobrevoando o Marrocos

Leer versión en español.

La Dreta de l'Eixample, meu bairro

“Todavía no caigo”, dizia o rapaz de Posadas, que, junto com a namorada, dividia comigo a fila do meio do voo LA8114, que partiu de Guarulhos com destino a Barcelona no domingo, 25 de fevereiro. Isso resumia bem o que eu tinha sentido alguns minutos antes, quando acordei no desconfortável assento depois de ter dormido cerca de 3 ou 4 horas e olhei para a tela à minha frente, que mostrava que estávamos sobrevoando o Marrocos.

Caralho, eu tô sobrevoando o Marrocos. Como cheguei aqui?

Era o segundo voo mais longo que eu já tinha feito. O primeiro voo longo em que viajei sozinha. Meu primeiro voo cujo destino seria a Europa.

Como cheguei aqui? Bem, tudo começou há mais de um ano. Ano e meio, digamos assim. Quando comecei a perder a esperança no meu futuro em Buenos Aires. Estava entediada com a vida, não tinha certeza do que viria pela frente, a situação econômica na Argentina não era muito animadora e já estava de saco cheio daquilo. Senti que talvez aqueles 6 meses, que depois se transformaram em mais de oito anos, pudessem estar chegando ao fim. Então decidi deixar uma porta aberta, só pra garantir. Iniciei os trâmites para fazer meu passaporte luxemburguês em Brasília e em cerca de seis meses ele já estava pronto para mim. Então aqui estou, graças a Christoph (e ao primo do meu pai que cuidou de toda a papelada para que tivéssemos a nacionalidade do nosso tatara tataravô).

É público e notório que desde então a situação econômica da Argentina não só não melhorou, como piorou significativamente, como nunca antes, desde que havia chegado em 2015. Meu ânimo também não melhorou, então comecei a fazer terapia e quando percebi, estava me despedindo de Buenos Aires e indo passar dois (insofríveis, porém necessários) meses e meio no Brasil.

E agora aqui estou, na minha nova cidade, no meu novo país, quase como naquele 2015, sem a parte do hostel rançoso, de não entender o que me dizem (pelo menos quando não falam comigo em catalão) e sem ter que contar moedas. Tudo de novo. Porque pra mim, disso se trata a vida. Recomeçar quantas vezes forem necessárias e viver todas as vidas possíveis dentro da única curta vida que nos deram.



*Este texto foi escrito originalmente em espanhol e traduzido ao português.

2 comentários: